Trabalhe enquanto eles dormem
E ai, como vai o trabalho?
Sou o Thiago, um dos sócios-fundadores da Labuta Labs. Em setembro de 2024, decidi me mudar para a Austrália e lá se vão 10 meses morando aqui e um tanto de história pra contar.
Decidi escrever sobre uma reflexão que tem me acompanhado nos últimos meses:
O que acontece quando você vive num lugar e trabalha para outro?
Morar num lugar com 13 horas de fuso pro Brasil, falar outra língua no dia a dia, viver a milhares de quilômetros do lugar que eu sempre chamei de casa — tudo isso muda mais do que só o endereço. Essa mudança me fez questionar muita coisa, desde crenças que eu tenho sobre trabalho à forma como organizo o meu dia.
E ao mesmo tempo, viver isso hoje é a realização de um sonho: trabalhar com o que eu acredito, com a Labuta, e morar na Austrália.
Hoje, minha rotina acontece à noite, é quando faço reuniões com o Brasil.
Pra mim, isso ainda soa meio estranho, venho de um contexto que trabalhar das 9h às 18h é o formato correto. Agora, começo reunião às 22h na Austrália, quando no Brasil são 9h da manhã.
Vivo num formato que, segundo o bom e velho horário comercial é o “incorreto”.
Tendo a noite ocupada pelo trabalho, o meu dia precisou se reorganizar.
Minhas manhãs, por exemplo, viraram tempo de qualidade — como se fosse uma noite livre no Brasil, só que aqui o sol já tá alto e o café tá na mão.
E, enquanto o Brasil dorme, minhas tardes viraram espaços de silêncio, sem Discord, sem Whatsapp e sem e-mails.
É uma versão mais saudável do clássico “Trabalhe enquanto eles dormem.”
A frase que virou mantra de sucesso e alta performance — como se fosse uma questão de dormir menos e se sacrificar mais. No meu caso, eu trabalho enquanto o Brasil dorme, mas isso não tem nada a ver com performance. Tem a ver com fuso e com um país chamado Austrália.
Bom, trouxe esse contexto para dizer o que?
Por hora, 3 reflexões:
1. A dissonância cognitiva não é só cultural.
Ela também é temporal, emocional e identitária. Agora é um ambiente completamente diferente: Outros costumes, outra língua, outros jeitos de ver o mundo, de viver o tempo, de se relacionar com o trabalho, com o corpo, com o outro. É algo libertador mas também parece que estamos frente a um precipício. Aqui ninguém me conhece. Isso é incrível e ao mesmo tempo dá um frio na barriga danado. É como habitar duas linhas do tempo simultaneamente.
2. O lugar do trabalho.
Intencionalmente, o trabalho passou a ocupar outro lugar dentro do meu tempo acordado. E isso abriu espaço para perguntas surgirem:
O que eu gosto de fazer no meu tempo livre?
Como eu quero ocupar esse tempo?
O que eu quero estudar?
O que é importante pra mim?
Quando o trabalho deixou de ocupar o centro, outras partes da vida começaram a ganhar espaço.
3. O trabalho é remoto e assíncrono.
Estar em outro fuso fez com que eu precisasse reorganizar meu dia e minha rotina. E, diferente de quando eu estava no Brasil, hoje eu separo com mais clareza o horário em que trabalho e o horário em que faço reunião.
PS: Sim, reunião é trabalho — mas não é só de reunião que se vive.
Porque, afinal: Se eu trabalho fazendo reunião, quando que eu realmente “trabalho”?
Viver aqui tem sido um experimento lindo.
Nem todo dia “dá certo” — tem dias que o corpo tá cansado, a cabeça tropeça, as ideias não fluem e nem sempre to no meu melhor.
Mas também tem liberdade, silêncio e descobertas.
Reorganizar o dia, repensar limites e acordos, lidar com o desconforto de não pertencer completamente a lugar nenhum.
Nada muito conclusivo, mas talvez não precise ser.
Talvez seja só sobre experimentar.
E no mais, a gente segue buscando construir bons dias para se trabalhar, aqui na Austrália.